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sexta-feira, 22 de maio de 2009

FORA DA PRATELEIRA: Orlando, de Virgínia Woolf

O nosso corpo é como uma cápsula que se adapta ao sabor do passar dos séculos, e a alma é como uma prisioneira céptica perante o senso comum que determina: tu és homem; tu és mulher. A escrita intemporal, inebriante, fantástica e poética de Virginia Woolf faz-nos apaixonar pela misteriosa personagem de Orlando, que, num primeiro momento, surge como elemento masculino, em pleno século XVI, de uma classe social inglesa. Num segundo momento, Orlando transfigura-se e passa a ser mulher. Eis a fórmula da androgenia. As diferenças entre um homem e mulher são analisadas e vivenciadas ao máximo por Orlando, num único ser que sente ambas as experiências na pele, numa análise, por vezes distante de si mesma, que procura chegar à compreensão se estas diferenças resultam apenas do género ou da sociedade. Esta personagem é sempre acompanhada pela angústia e pela solidão, pela incompreensão, pela inquietude reflexiva e poética perante as grandes questões sobre o Amor, a Vida e a Morte. E as suas dores e alegrias tornam-se facilmente nossas. Decorrem quatrocentos anos desde o transitar tranquilo do velho mundo para o mundo contemporâneo, e quando chegamos com Orlando a 1928...lamentamos ter chegado ao fim desta soberba narrativa.
É sempre delicioso voltar a este clássico da literatura, mas também existe o filme: Orlando, com a intensa participação de Tilda Swinton. Ambos a não perder!
"Nada mais arrogante, porém, embora nada seja mais vulgar, do que presumir que apenas existe um Deus, e religiões só a de quem assim se exprime. Orlando, ao que parece, tinha uma fé muito sua. Com o maior fervor religioso, reflectia agora acerca dos seus pecados e das imperfeições que se haviam insinuado na sua condição espiritual. A letra S, pensava ela, é a serpente no Éden do poeta. (...)Mas o "S" era coisa de somenos, a seu ver, comparado com a terminação "ando". O particípio presente era o Demónio em pessoa (agora que nos achamos no local próprio para acreditar em demónios). Fugir a tais tentações é o primeiro dever do poeta, concluiu, pois sendo o ouvido a antecâmara da alma, a poesia pode corromper e destruir muito mais que a luxúria ou a pólvora. O ofício do poeta é, pois, de todos o mais alto, prosseguiu Orlando. As suas palavras alcançam lugares onde as dos outros não chegam. (...) Devemos moldar as nossas palavras até que sejam o mais fino invólucro dos nossos pensamentos. (...)
"Estou a crescer",pensou, pegando enfim na vela. "Estou a perder algumas ilusões", (...)".
in Orlando, de Virgínia Woolf



domingo, 17 de maio de 2009

HOW I WISH...

Gostava de escrever coisas bonitas porque as "coisas" também se escrevem. Mas como sofro de inspiração ocasional, olho em redor e as palavras não me nascem puxadas ao lustro. O engraxador de palavras anda ausente...ou, então, bastante atarefado. Tentando dar brilho ao dia-a-dia que nos chega a casa tão rotulado, no telejornal da noite. Gostava de ver o anti-telejornal, com a outra face da mesma moeda e saber que o mundo ainda sorri perante a humana presença nesta terra que herdamos todos os dias. Que nós, seus fiéis jardineiros, não deixávamos crescer as ervas daninhas das guerras e dos ódios, das ambições e dos loucos poderes; que cortávamos, pela raiz, as urtigas da fome e da pobreza e sarávamos todos os jardins das doenças e das misérias.Gostava de ter, nas mãos, as sementes brilhantes do amor, que explodissem no húmus fértil de todos os corações por aí fora, em folhagens novas de actos humanos altruístas.Gostava de não precisar ligar o televisor para procurar num anti-telejornal as notícias disso. E só porque eu gostava ( e realmente gostaria!) é que o escrevo aqui, em lugar de escrever as coisas verdadeiramente bonitas. Porque as sombras das intenções também podem ser contornadas a brilho.

sábado, 16 de maio de 2009

FORA DA PRATELEIRA: dois "gigantes" de Ken Follett

Desde há uns tempos atrás, andava intrigada e curiosa com os livros de Ken Follett...aqueles mais "virados" para a parte da história medieval. São dois os volumes que compõem Os Pilares da Terra, com a continuação de mais dois volumes intitulados Mundo sem Fim (que não têm de ser uma continuação obrigatória, visto que a acção destes últimos passa-se duzentos anos após os dois primeiros).
Optei por comprar, em vez de quatro volumes (cada um deles a vinte e tal euros!), dois volumes (o primeiro, Os Pilares da Terra, com os dois volumes; e o segundo, Mundo sem Fim, com os dois volumes também). Estes dois livros custaram-me um à volta de sete euros e o outro à volta de onze. Fiquei maravilhada com o que consegui poupar (não só em termos de espaço nas prateleiras, como também em termos de dinheiro!). No entanto, são livros originais, portanto, escritos em inglês. Lê-se bem e estamos a treinar o nosso inglês!
Ken Follett consegue remeter-nos, na perfeição, para o ambiente histórico que pretende recriar, desde os aspectos mais simples do quotidiano das personagens até aos grandes momentos datados e comprovados pela História da Humanidade. Conseguimos vibrar e situar-nos nos ambientes das feiras, dos castelos, das florestas e das igrejas da época. Percebemos a lógica de construção das enormes catedrais...
No primeiro volume: The Pillars of the Earth, a história ocorre no interior da Inglaterra do século XII, durante a construção de uma catedral gótica e os vários personagens envolvidos directa e indirectamente na construção da mesma. Durante essa construção (que dura duas gerações), as personagens encontram-se (e desencontram-se) numa história repleta de acontecimentos que, se não fosse a documentação histórica dos factos ocorridos naquela época para atestar a sua veracidade, poderiam parecer-nos quase inverosímeis: miséria, perseguições da igreja, luta pela sobrevivência, bruxaria, ódio, vingança, desejo, erotismo, paixão e amor, são alguns poucos ingredientes que preenchem essa grandiosa narrativa. A narrativa envolve-nos até nos momentos em que não estamos a ler o livro!
Em World without a End (segundo volume) o priorado de Kingsbridge, passados duzentos anos, volta a ser palco do mesmo estilo deste escritor. A acção começa com o testemunho de quatro crianças que presenciam a morte de dois guardas da rainha, por um cavaleiro que viria a tornar-se monge, mais tarde. Um crime ao qual eles comprometem-se a manter em segredo. Apesar das diferenças sociais que os separam em plena Idade Média, pelas três décadas seguintes, as suas vidas seguem entrelaçando-se, em encontros e desencontros que geram do maior amor ao ódio mais profundo.
Paralelamente às trajectórias de Caris, Merthin, Ralph e Gwenda, entramos na história da pequena, mas promissora, vila do interior da Inglaterra, onde a lei é determinada pela Igreja, que interfere em todas as actividades, não importando se elas tenham um carácter espiritual ou comercial. Tudo é supervisionado pelo padre prior nesta terra medieval, povoada por reis e cavaleiros, servos e senhores.
Ao longo da história, o escritor menciona antigos moradores, protagonistas de Os Pilares da Terra (primeiro volume).

Diz-se que Os Pilares da Terra vai ter adaptação para uma série de televisão pela produtora do director Ridley Scott (Gladiador), com previsão de estreia em 2009. Fico a aguardar que tal suceda e apareça por cá! :)
E hoje de tarde, sei que Ken Follet marca presença na Feira do Livro de Lisboa...mas para mim, nada feito, infelizmente!
Boas leituras!

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Låt den rätte komma in (Let The Right One In)

Antecipando a estreia prevista para Portugal no dia 21 de Maio, desde já aconselhamos estarem atentos a esta película, para os verdadeiros amantes de cinema.

Desde o início do filme somos convidados a entrar num ambiente gótico que é emoldurado por um visual de solidão e, ao mesmo tempo, de uma inocência muito crua.
A excelente fotografia deixa-nos testemunhar um ambiente propício para uma história sobre vampirismo: o frio, a noite, gelo, espaços fechados e escuros, a própria geometria da construção nórdica transmite-nos um conceito de imagem absolutamente esmagador. O que há muito tempo não sentíamos ao observar um filme.


Esta é a história de Oskar, um rapaz de doze anos, que colecciona recortes sobre assassinatos e mortes misteriosas, como forma de vingança interior perante o facto de ser vítima de bullying na escola, e filho de pais separados que não lhe dão a devida atenção.
Este rapaz é atraído por uma rapariga, também com doze anos, que surge inesperadamente por diversas vezes, testemunhando as metamorfoses de solidão de Oskar. A amizade que surge entre ambos, rapidamente se transforma num amor inocente que ultrapassa a diferença de raças. Sim, porque Eli é mais do que uma simples rapariga, é uma vampira: com duzentos anos de idade, mas num corpo de menina.
Conforme o filme vai avançando é extremamente difícil não ficarmos deslumbrados com a beleza poética de muitas cenas que permanecem na nossa memória por muito tempo; podemos enumerá-las mas, de facto, é aconselhável verem pelos vossos próprios olhos.
Este filme é baseado num livro do escritor Sueco John Ajvide Lindqvist, sendo o realizador Tomas Alfredson, também da mesma nacionalidade, o que prova mais uma vez que o cinema Europeu bate aos pontos a falta de originalidade e talento do cinema Norte- Americano. Na calha, está uma versão americanizada deste filme, provavelmente, repleto de efeitos especiais em vez da poesia visual e narrativa desta película de origem Sueca.
Este é um filme a ver, principalmente a níveis estéticos.